quarta-feira, 12 de agosto de 2009

SESSÃO DE AUTÓGRAFOS

Escritor novato em sua primeira sessão de autógrafos. Vinte e poucos anos. Veste uma garbosa jaqueta de camurça.

Na fila que se forma, é fácil distinguir uma pessoa em particular. Tão jovem quanto o escritor, vestindo terno escuro, magro, o leitor aguarda sua vez na fila. E distingui-lo é fácil porque, de forma insistente, encara o escritor com expressão azeda.

O jovem escritor para de repente de assinar seu nome, confuso, e olha para fila.

Os dois trocam um olhar de reconhecimento. O escritor fecha a cara quando reconhece seu leitor.

O sorriso amável da senhora que aguarda seu autógrafo o faz piscar os olhos, largar a expressão irritada e soltar um sorriso decente.

O escritor se nega a olhar outra vez para a fila. A partir de agora, percebemos que assina seu nome de forma quase automática, trocando palavra breves com todos.

Chega a vez do leitor colher seu autógrafo. O escritor não consegue levantar seu olhar da mesinha.

LEITOR - Ei, oi...

ESCRITOR - (levantando o olhar) Tu devia tá aqui?

LEITOR - Não sei, o que tu acha?

Escritor fica emburrado e se cala.

O leitor se diverte.

LEITOR - Não quer me dar um autógrafo?

ESCRITOR - Jura que tu tá interessado nisso.

LEITOR - Tô sim. Olha o livro aqui.

Escritor olha o exemplar na mão do leitor, que pousa o livro na mesa de autógrafos.

Escritor está sem reação. E ainda assim, completamente incomodado.

(Por mais difícil que fosse manter a caneta entre seus dedos, por maior desprezo que sentisse pelo jovem, ele nunca ouvira falar de um autor que se negasse a autografar seu próprio livro em uma sessão de autógrafos).

Escritor suspira, derrotado. Pega o livro pra assinar.

O leitor, com um gesto ágil, puxa o livro de volta.

LEITOR - Pensando melhor...

ESCRITOR - (explode) Eu sabia! Porra!

LEITOR - (irritado) Presta atenção! Tu sabe porque eu vim aqui. Quero uma explicação.

ESCRITOR - Explicar o quê? Tu acha que preciso pedir desculpas?

LEITOR - Tu vai achar, no final, quando ela não aparecer.

ESCRITOR - Ela não vem?

LEITOR - O que tu acha?

Logo atrás, impacientes, outros leitores davam mostra de que não suportariam mais aquela discussão. O leitor aproveitou a deixa e desapareceu na direção de uma bandeja com vinho tinto que um garçom carregava.

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