sexta-feira, 31 de julho de 2009

GRAN TORINO – ENSINANDO A SER HOMEM

Thao arruma o jardim de Walt, que o observa, como sempre irritado, até o momento em que resolve trocar “umas palavras” sobre o futuro do jovem.

WALT - Não pretende ir a escola?
THAO - Sim, mas a escola custa dinheiro.
WALT - Devia arranjar um emprego, não vai poder ficar cuidando do meu jardim a vida toda.
THAO – Você podia me pagar.
WALT - Muito engraçado.
THAO - Que emprego posso arranjar?
WALT - Tem razão. Ninguém nunca vai contratar você.
THAO - Pois é...
WALT - Olhe, estou brincando, china. Você pode arranjar um emprego. Em qualquer lugar.
THAO - Tipo o quê?
WALT - Que tal em uma obra?
THAO - Em uma obra, eu? Por acaso tá com Alzheimer?
WALT - Não, pode arranjar um emprego numa obra. Tenho amigos nesse ramo. É claro que vou ter que ensiná-lo a ser homem.
THAO - Me ensinar a ser homem?
WALT – É.

Roteiro: Nick Shenk – Direção: Clint Eastwood

O GOSTO DOS OUTROS

Como é legal descobrir filmes "antigos" - esse é de 1999.
Aos 24 anos esse filme diria uma coisa, aos 34 ele diz bem mais, cresce como estória.


O Gosto dos Outros, roteiro de Jean-Pierre Bacri e Agnès Jaoui, se revela uma bela observação sobre o amor.
Quem nos ama é quem achamos que devemos amar?
O amor pode surgir através da pena? Ou da persistência? Ou do reconhecimento?


"Não se preocupe, foi por gosto" - Castella fala do afresco que encomendou dos amigos artistas de Clara, mas o que nos interessa aqui é entender o mecanismo (ou a falta dele) no interesse amoroso. O dono "grosseiro" de uma empresa de transportes pode se apaixonar por uma discreta atriz e professora de inglês? Ela acha que não. Ele se apaixona assim mesmo. Questão de gosto: "Agradar a você, como me disse, é impossível. Eu já entendi". Iremos acompanhar a mudança de percepção da atriz. Ele insiste, se faz presente, faz papel de bobo - involuntário. Ela não dá bola, depois fica com pena. Sempre distante.

Clara tem seu "súbito despertar" durante uma conversa - num teste de figurino - com sua amiga, a figurinista. Essa amiga declina de um convite para jantar. Tem um compromisso com Fred. Explica: "A vida é estranha. Nunca apostaria nessa história. Ele é tão diferente de mim. Engraçado como às vezes erramos com as pessoas. Quando penso que quase o perdi...". A atriz escuta em silêncio, quase inexpressiva, mas esse é o momento de turbulência interior (que, na literatura, renderia páginas de narração em primeira ou terceira pessoa com o objetivo de explicar tudo o que se passa em sua cabeça quando descobre que a figurinista está falando mesmo é da sua estória com Castella – nesse ponto do filme quase “perdida para sempre”.

Na cena seguinte, Clara conversa com seu amigo e pergunta se Castella irá na estréia de sua peça. Ele não sabe. Ela, nervosa, diz que o convidou - querendo dizer que não teve uma resposta dele, tentou e, agora, só pode torcer para não ser tarde demais.

Nao por acaso, ela observa aflita a platéia antes da peça começar e vê a cadeira vazia onde supomos Castella deveria estar.

Não por acaso, ela interpreta Hedda Gabler, de Ibsen, se suicidando ao final.

Não por acaso, ela mantém o semblante triste durante os aplausos, ao final da peça, e observa novamente a cadeira vazia (morta como sua personagem na peça).

E, não por acaso, abre o mais radiante sorriso visto por mim no cinema quando vê alguém na platéia.

Corta para um rosto na obscuridade, o foco ajusta e vemos Castella aplaudindo-a.

Não por acaso é esse o momento - o momento do amor, o velho Boy Meet Girl - que Clara dará finalmente o primeiro sorriso no filme.

Clara, interpretada por Anne Alvaro, vai da falta de sentido em sua vida até a alegria, o preenchimento. Tudo porque entendeu que o amor pode surgir entre “pessoas diferentes”, pode surgir de qualquer jeito porque "a vida é estranha", porque "às vezes erramos com as pessoas".

O Gosto dos Outros é puro encantamento, força artística, sublime alegria. Uma comédia romântica “adulta” que trabalha com cuidado e carinho o primeiro ato dos filmes normais.

O Gosto dos Outros termina quando o casal se reconhece como casal. O depois é outra estória. E mesmo assim, vale a pena.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

MCEWAN & HITCHCOCK – AO DEUS-DARÁ

O segundo romance de McEwan, lançado em 1981, quando o autor tinha 33 anos, demonstra maior domínio do suspense e do macabro, bem como maior influência de Hitchcock.

Desta vez, a estória é narrada em terceira pessoa.

Narrar o suspense em terceira pessoa requer habilidade. O escritor não tem a facilidade de criar uma voz alucinada ou assustadora. Ele precisa contar. Construir. O suspense nasce do acúmulo, da liberação de informações.

Desta vez, as personagens são adultas, levam vidas normais e não aguardam nada de estranho em suas vidas.

Narrar o suspense com personagens como eu ou você requer construir o suspense em oposição às personagens. Usar um cenário adequado às pretensões da estória é um bom apoio. Criar situações dramáticas/climáticas com honestidade, possíveis de acontecer com todo mundo, também.

O suspense, o desconforto, nasce da potência tanto da situação vivida pelas personagens quanto da habilidade em narrá-las. Exemplo: o esforço do casal para conseguir beber água enquanto perambulam pela cidade no amanhecer, depois de uma noitada.

Em Ao Deus-Dará o suspense não é causado por ações deliberadamente chocantes do protagonista. E também não existe um “Derek”, uma personagem que descobre as más ações do protagonista.

Em Ao Deus-Dará McEwan cria o suspense e o macabro por meio de um antagonista.

E um antagonista de respeito, diga-se de passagem. Robert surge carregando o estranhamento necessário para levar a história (o suspense) adiante e mantém-se forte durante toda a narrativa, cada vez mais surpreendente, violento, obcecado e real.

Robert tem um passado impagável, descrito com tamanho preciosismo e virtuosismo narrativo que "compramos" sua história - um legítimo flash-back no meio do livro - sem pestanejar.

A partir desse flash-back, Mcewan ganha liberdade (legitimidade) do leitor para levar o casal protagonista ao inferno.

Aqui um parêntese: como deixar crível a maldade de um antagonista? Como não explicar demais a maldade de um antagonista, a ponto de racionalizar ao limite e perder o mistério, a magia? Antagonista muito explicadinhos se tornam teses-que-falam (sou desse jeito porque tal situação "freudiana" aconteceu comigo no passado). Antagonistas pouco ou nada ou mal explicados se tornam gratuidades-que-falam (sou desse jeito porque o autor queria alguém muito-mal-porém-sem-substância, achando que isso seria o suficiente para o espectador/leitor).

McEwan cria um meio-termo pra lá de bom em Deus-Dará.

Então:

Protagonistas: temos um casal como eu e você em viagem de férias. O relacionamento deles é legal, mas não está muito legal. Eles se amam, porém a paixão já os deixou. Eles querem bons momentos, apenas isso.

Cenário: estão numa cidade estranha, num país diferente (ecos de O Homem que Sabia Demais?)

Situações: McEwan criou situações bem próximas do que normalmente ocorrem com turistas em lugares desconhecidos, porém, aumentou o grau de dificuldade. Em Ao Deus-Dará, sair para um simples jantar após as nove horas da noite torna-se uma atividade perturbadora.

Antagonismo: E temos um antagonista magistralmente plantado na história desde as primeiras páginas (só vamos descobrir a engenhosidade numa segunda leitura), que de sujeito estranho torna-se perigoso e de perigoso torna-se psicopata.

Na segunda leitura (o livro merece uma terceira, fácil), descobrimos, assustados, que esse antagonista passa de psicopata para um ser do mal absoluto, que espreita os protagonistas com a avidez e a maldade de um Deus do Mal, brincando sordidamente com a vida sossegada das pessoas comuns.

Hitch, obviamente uma influência brutal na estrutura narrativa, bateria palmas.

McEwan trintão era duca.

MCEWAN & HITCHCOCK - O JARDIM DE CIMENTO

McEwan usa em seu primeiro romance, lançado em 1978, quando o autor tinha 30 anos, o suspense e o macabro como artifícios narrativos.

O narrador é um garoto de quinze anos, Jack. Essa é uma idade boa para se entender tudo errado, agir por impulso, como todos sabem. A estratégia narrativa aumenta a sensação de vazio existencial do romance. Não há culpa. Ações são realizadas sem aparente motivação ou análise.

Em primeiro plano, a confusão adolescente, a sexualidade adolescente, a ânsia por liberdade adolescente.

Influência de Hitchcock

Como em Janela Indiscreta, o uso de um cenário constante prende nossa atenção. No caso, a casa da família de Jack. Que se transforma em um mundo à parte. Sufocante. Poucas sequências do livro são narradas em outro ambiente.

A doença da mãe, a mãe de cama, sua falta de vigor, sua morte.

Quatro filhos “entregues à própria sorte”, conforme contracapa da Editora Rocco.

Mas o elemento principal é a entrada em cena de Derek, o namoradinho de Julie (a irmã mais velha do narrador), no terço final do romance.

Com sua presença cria-se o que Hitchcock chamava de suspense.

(Alguém coloca uma bomba debaixo de uma mesa. Duas pessoas sentam ao redor dessa mesa e iniciam uma conversa).

No livro: há um corpo enterrado no porão daquela casa. Há 4 crianças sozinhas, abandonadas ‘à própria sorte”, sem a supervisão de um adulto. Há a entrada em cena de uma personagem de fora da família, que nada sabe sobre o passado.

Questão que se coloca: será que essa personagem vai descobrir o corpo? Quando? E o que vai acontecer quando ela descobrir?

O talento narrativo de McEwan nos faz ir em frente, queremos entender (desvendar) essas questões.

O final tenso, cinematográfico e correto, nada mais é do que lógico.

McEwan escreve contando com o voyerismo do leitor.

E tem razão. Observamos curiosíssimos a vida daqueles jovens.

sábado, 18 de julho de 2009

WHATEVER WORKS

Uma sacada cômica do Woody Allen que pode ser utilizada por todos é dar humor a uma situação fazendo com que problemas venham ao encontro de uma personagem:

A) arredia

B) neurótica

C) misantropa

D) egoísta

Aparentemente é o que acontece em Whatever Works, novo filme do cineasta, que só estréia no segundo semestre por aqui.

De qualquer forma, a observação é a seguinte: compor uma personagem com tais "qualidades" é encher um balão com ar quente, pronto pra explodir a qualquer momento, sob qualquer pretexto.

As motivações são infinitas.

Invente as suas!

quinta-feira, 16 de julho de 2009

INVERNO

Das falas supostamente cafajestes:

"O inverno deve ser frio para quem não tem memórias ardentes"

do roteiro de: Leo McCarey / Delmer Daves / Donald Ogden Stewart para o filme Tarde Demais para Esquecer.

terça-feira, 14 de julho de 2009

THE SOPRANOS

O genial em Família Soprano é que tu começa a rever os episódios – a segunda temporada, por exemplo – e todos parecem jovens e agem com tal leveza que tu tem vontade de gritar bem alarmado pra eles:

“Vocês nem imaginam as pressões que terão de suportar! Não fazem idéia do que ainda vai acontecer com suas vidas, seus ingênuos!”.

E quando sou tomado por esse impulso é o momento quando percebo a grandiosidade de The Sopranos.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

O CARANGUEJO NO BARBANTE II

PERSONAGENS:
AVNER – ESTUDANTE, 15 ANOS
GISELE – ESTUDANTE – 15 ANOS
CENÁRIO:
DEBAIXO DA PLATAFORMA DE PESCA DE ATLÂNTIDA NUM GELADO DOMINGO DE INVERNO.

CENA II

GISELE E AVNER DESCONFORTÁVEIS, DISTANTES ALGUNS METROS UM DO OUTRO. GISELE OLHA PARA AVNER, QUE OBSERVA O MAR QUEBRANDO CONTRA OS PILARES DA PLATAFORMA.
GISELE — Estamos sozinhos agora. (C/ ENFADO) Teu pai e o meu vão beber o dia todo.
GISELE AGARRA UMA PONTA DO SEU CABELO E A LEVA ATÉ O NARIZ. FAZ UMA EXPRESSÃO ENOJADA.
GISELE — Meus cabelos já tão com cheiro de maresia.
AVNER OLHA PARA OS LADOS.
OS DOIS ESTÃO SOZINHOS.
AVNER CRUZA OS BRAÇOS E ENCARA GISELE.
AVNER — E agora?
GISELE — (PENSATIVA) Se tu fosse legal de verdade, agora seria como nos filmes, quando o casal está sozinho e se beija e tudo escurece.
AVNER — Tu me beijaria?
GISELE — (LEVE REPRIMENDA) Eu disse se tu fosse legal mesmo.
AVNER — (DANDO DE OMBROS) E se a gente estivesse dentro de um filme...
GISELE — (DECEPCIONADA) Tu é completamente bobo. Pra dizer a verdade, tenho certeza que tu não sabe o que acontece com um casal depois que tudo escurece num filme.
AVNER — Não fala besteira!
GISELE — Besteira nada.
AVNER — É sim, a maior besteira que tu já disse na vida!
GISELE — Besteira nada!
AVNER TENTA CONTROLAR SUA IRRITAÇÃO SE ABAIXANDO. NUM IMPULSO, FORMA UMA BOLA DE AREIA ENTRE AS MÃOS.
COM A BOLA DE AREIA PRONTA, AVNER OLHA PARA GISELE COM UM MEIO-SORRISO MAROTO, ENQUANTO PESA SEU PETARDO, BALANÇANDO O BRAÇO PARA CIMA E PARA BAIXO.
AVNER FICA SÉRIO. ESMAGA COM DELICADEZA A BOLA DE AREIA COM A OUTRA MÃO.
A BOLA DE AREIA ESCORRE POR ENTRE OS DEDOS DE AVNER, ATÉ DESAPARECER.
AVNER — Ontem de noite eu vi um desses filmes em que o casal fica sozinho.
GISELE — (SURPRESA) Mesmo?
AVNER — Só que no caso desse filme que vi ontem, não falta luz nem nada. O casal faz o que tem que fazer, e a gente assiste a tudo.
GISELE PASSA A MÃO NAS PONTAS DE SEU CABELO.
GISELE — (DISSIMULANDO SEU INTERESSE) Ela era bonita?
AVNER — A garota?
GISELE — É, a garota, claro.
AVNER — Bastante. Nem era brasileira nem nada, mas era gostosa, muito gostosa.
REAÇÃO DE GISELE, QUE SE VOLTA COMPLETAMENTE PARA AVNER.
GISELE — Sou mais bonita que ela?
AVNER OLHA PARA O CORPO DE GISELE.
GISELE — Ei, te fiz uma pergunta.
AVNER — Eu ouvi.
GISELE — Então?
AVNER — Tu tá falando do rosto dela?
GISELE — Ih, nem vem com essa história! Tô falando de beleza.
AVNER — Tu é bonita, muito bonita.
GISELE — (SATISFEITA COM A RESPOSTA) Obrigada.
GISELE OLHA O MAR BATENDO CONTRA OS PILARES DA PLATAFORMA.
GISELE SORRI.
ONDA BATE CONTRA OS PILARES, COMO UMA EXPLOSÃO.

CARACTERIZAÇÃO I

O DIRETOR CHEGA NO ATOR, QUE SEGURA ALGUMAS FOLHAS GRAMPEADAS.
DIRETOR
Teu personagem é um jovem que estudou japonês no Kumon do bairro por nove anos e que, aos 18, abandonou tudo – família, mina, pré-vestibular – pra ir morar na Suécia. Entendeu?
ATOR
Nove anos estudando japonês e abandonou tudo pra viver na Suécia, hm-rm.
DIRETOR
Complexo, né?
ATOR
Ô...
DIRETOR
Sabia que tu ia entender de prima, por isso te chamei.
ATOR
Pode deixá comigo.
DIRETOR
Mata essa no peito?
ATOR
Mato e faço gol.
DIRETOR
Vai ter que decorar umas vinte palavras em japonês, tá?
ATOR
Tranquilo
DIRETOR
Umas frases em sueco...
ATOR
Tamos aí.
DIRETOR OLHA PARA OUTRO LADO, ACENA E SAI.
DIRETOR
Beijo, a gente se fala mais tarde.
ATOR SORRI AMIGAVELMENTE ATÉ DIRETOR DESAPARECER. O SORRISO VIRA UMA CARETA DECEPCIONADA. AS MÃOS ESMAGAM AS FOLHAS GRAMPEADAS ATÉ TORNÁ-LAS IRRECONHECÍVEIS.

terça-feira, 7 de julho de 2009

O CARANGUEJO NO BARBANTE I

PERSONAGENS:
AVNER – ESTUDANTE, 15 ANOS
GISELE – ESTUDANTE – 15 ANOS
CENÁRIO:
PLATAFORMA DE PESCA DE ATLÂNTIDA NUM GELADO DOMINGO DE INVERNO.

CENA I
GISELE ESBARRA EM AVNER, QUE TENTA CONTINUAR EM FRENTE. GISELE FECHA PASSAGEM.
GISELE — Ridículo o teu jeito de agir, agora a pouco.
AVNER ESBOÇA UM SORRISO DE ANUÊNCIA.
GISELE — Baita cara de pau tu ter vindo me cumprimentar.
AVNER ENCOLHE O CORPO, NUMA TENTATIVA DE PROTEÇÃO E COMEÇA A ROER A UNHA DO DEDÃO ESQUERDO. EM SEGUIDA, OBSERVA O CORPO DE GISELE COM PAIXÃO, ATÉ VOLTAR A SI, FIXANDO O OLHAR NO ROSTO DELA.
AVNER — Como tu gostaria que eu tivesse agido?
GISELE — Quem sabe de uma forma menos humilhante?
O VENTO JOGA O CABELO DE GISELE CONTRA SEU ROSTO. GISELE LIMPA COM A MÃO A MECHA DE CABELO DO ROSTO E A JOGA PARA TRÁS. ALGUNS FIOS FICAM PRESOS NO ROSTO, NOS LÁBIOS, E GISELE, IRRITADA COM A SITUAÇÃO, ASSOPRA OS FIOS DESOBEDIENTES, MANTENDO-SE SEMPRE EM POSIÇÃO DE CONFRONTO COM AVNER.
GISELE — É impressionante esse teu jeito, quer dizer, a gente chega a ficar com medo de ti. Eu sempre me senti incomodada quando te via.
GISELE PERCEBE DEFINITIVAMENTE QUE SEU CABELO SÓ IRÁ PARAR QUIETO SE O SEGURÁ-LO COM AMBAS AS MÃOS. GISELE PUXA O CABELO PARA TRÁS E SUSPIRA, DECEPCIONADA.
GISELE — Algumas gurias te acham completamente pirado.
AVNER FAZ UMA CARETA AZEDA. EM SEGUIDA, FINGE NÃO ESTAR SENTINDO-SE MAL.
AVNER — Essa é boa. De verdade, muito boa.
GISELE — Não tô brincando, não. A Michele uma vez chegou a perguntar pras tuas colegas quando é que elas achavam que tu iria fazer uma burrada violenta.
AVNER — (PARA DE ROER A UNHA DO DEDÃO, ESTUPEFATO) Burrada violenta?
GISELE — É.
AVNER — O que tu tá falando, quer fazer o favor de me explicar?
GISELE — Não te faz de bobo.
AVNER — Não tô me fazendo de bobo.
GISELE — (ESCLARECE, COM AR DE ENFADO) Entrar na sala de aula armado, ou jogar uma cadeira pela janela, essas coisas boçais e sem controle que a gente vê os pirados que estudam fazerem de vez em quando na TV.
AVNER — (MAGOADO) Eu não sou boçal. Nem sem controle. A Michele é uma histérica.
GISELE COLOCA AS MÃOS NA CINTURA E PENDE A CABEÇA PARA PERTO DE AVNER.
GISELE — Olha aqui, não vou ficar defendendo a chata da Michele, só porque ela disse um negócio que eu também penso de vez em quando.
AVNER PERCEBE QUE A GURIA ESTÁ COM O ROSTO PRÓXIMO DO DELE.
GISELE, QUE NÃO ESTÁ NEM AÍ PARA O FATO, DÁ UM LEVE TAPA NA SUA TESTA. ELA FAZ A EXPRESSÃO DE QUEM LEMBROU DE UM ASSUNTO IMPORTANTÍSSIMO, PORÉM BASTANTE DESAGRADÁVEL. EM SEGUIDA, FICA AINDA MAIS IRRITADA.
GISELE — E aqueles e-mails? Puxa, tu percebeu que coisa sem graça que tu fez? Não tava preparada pra aquilo, não tava mesmo.
AVNER FICA CONSTRANGIDO.
AVNER — Eu acho que tava mesmo meio descontrolado aquele dia...
GISELE — Aquele dia? Tu fez isso por mais de um mês. Eu nem sei como tu conseguiu o meu e-mail, se tu quer saber a verdade. E aquelas baboseiras sexuais todas?
AVNER — Me disseram que tu tinha dito uma coisa sobre mim.
GISELE — Bela tentativa. Mas eu não acredito. Tu gosta de ser assim. Deve fazer bem pro teu ego, ou coisa parecida.
AVNER — (TENTANDO SE DEFENDER) Quando eu escutei o que tu tinha dito sobre mim, fiquei furioso.
GISELE — (INCRÉDULA) Quem te disse uma besteira sem tamanho como essa? Como é que tu acredita quando alguém te diz uma coisa dessas?
AVNER — Fiquei ofendido, oras. Imagina ir a uma festa de criança e, chegando lá, perceber que a festa não tem balões, nem bolo de aniversário ou chapéus em forma de cone...
GISELE PRESTA ATENÇÃO.
AVNER ENCARA A COLEGA
AVNER — Foi assim que eu me senti...
AVNER CONSEGUE ESCAPAR, DE SOPETÃO, E SOME NA DIREÇÃO DA SAÍDA DA PLATAFORMA.
GISELE FICA NA MESMA POSIÇÃO, DE ALGUMA FORMA COMEÇANDO A ENTENDER A ATITUDE DE AVNER.

MURILO, AMANDA E AS ORQUÍDEAS


APARTAMENTO DE AMANDA. SALA. INT. NOITE
MURILO CAMINHA DE CUECA SAMBA-CANÇÃO E PARA DIANTE DE UM ARRANJO FLORAL DECORATIVO. NA CASCATA SUSPENSA COM TRÊS VASOS VEMOS SOMENTE DUAS BELAS ORQUÍDEAS.
MURILO VAI AOS POUCOS PERCEBENDO QUE ALGUMA COISA NÃO ENCAIXA. QUANDO ENTENDE QUE FALTA UMA ORQUÍDEA NO ARRANJO, DÁ MEIA VOLTA ATÉ O

APARTAMENTO DE AMANDA. QUARTO. INT. NOITE
MURILO ENTRA IRRITADO E PARA NA FRENTE DA CAMA, ONDE AMANDA SE ENCONTRA DEITADA, LENDO UM LIVRO - “CASAIS TROCADOS”, JOHN UPDIKE – COM DELEITE.
MURILO — Cadê a orquídea mais de cima? Só tem duas na cascata.
AMANDA — (OLHANDO POR CIMA DO LIVRO) Dei pra minha tia. (OBSERVA AS MÃOS VAZIAS DE MURILO) Já bebeu água?
MURILO — (A CORTANDO) Sua tia?
AMANDA — Ela se encantou com as orquídeas. E ficou tão emocionada com o presente.
MURILO — Você deu a orquídea pra sua tia só porque ela se encantou com ela?
AMANDA — Dei, ué...
AMANDA AJEITA OS TRAVESSEIROS ÀS SUAS COSTAS, AINDA SEM PERCEBER A PROFUNDA IRRITAÇÃO DE MURILO.
MURILO — (CRUZANDO OS BRAÇOS, AFETADO) Ela pediu pra você dar a orquídea ou você deu por dar?
AMANDA — Sei lá, não lembro. Onde tu quer chegar?
MURILO — Eu gostava das três orquídeas nessa cascata de vasos, você não sabia?
AMANDA — (PENSATIVA, TENTANDO RECORDAR) É, acho que tu tinha comentado.
MURILO — (CHOCADO COM O DESDÉM) Comentado? Eu disse... (BALANÇA A CABEÇA, INCRÉDULO) ...você não lembra do ano passado? Eu disse, eu comentei, nossa, eu disse ‘são perfeitas, essas orquídeas aqui nesse cantinho da sala, são perfeitas. Elas me lembram de você, da gente. O que você acha da gente nomear elas como nossas plantas oficiais?’.
AMANDA — Tu falou isso?
MURILO — Meu Deus, falei!
AMANDA — Desculpe, não lembrava.
MURILO — Amanda! Eram... nossas... plantas... oficiais... Se alguém perguntasse sobre como nosso relacionamento poderia ser descrito, eu mostraria as três orquídeas.
AMANDA — (LARGANDO O LIVRO NA CAMA) Nossa, como tu era apegado.
MURILO — A orquídea já deve tá morta há essa hora.
AMANDA — (ERGUE O TRONCO) Ei! Minha tia não é nenhuma matadora de flores.
MURILO — (APROXIMA-SE DA CAMA) Sua tia deve ter se lixado pro presente assim que saiu daqui. Deve ter esquecido o vaso dentro do carro, pegando sol quente. Ou pior, no porta-malas, sem luz nenhuma.
AMANDA — (AGARRANDO UM TRAVESSEIRO E APONTANDO UM DEDO) Não fala assim da minha tia!
MURILO — (AMEAÇADOR) Falo o que eu quiser!
AMANDA EMPURRA O EDREDON PARA OS PÉS DA CAMA, GIRA O CORPO E LEVANTA-SE. DEPOIS DE ENCAIXAR AS PANTUFAS NOS PÉS, INICIA UM CAMINHAR DE PASSOS RÁPIDOS, MARCIAIS E ESPAÇADOS ATÉ A

APARTAMENTO DE AMANDA. SALA. INT. NOITE
AMANDA SURGE NO MESMO PASSO. MURILO A SEGUE. AMANDA PARA DEFRONTE AO ARRANJO FLORAL E CRUZA OS BRAÇOS, INCRIVELMENTE IRRITADA.
AMANDA — Quer saber? Duas orquídeas significam muito mais o relacionamento entre um casal do que três! Que história oficial é essa de ‘orquídea oficial’ se a nossa relação não tem nada de oficial? E quem era pra ti a terceira orquídea, quem ela significava? Fala, seu puto!
MURILO ABSORVE A REPRIMENDA E FICA SEM PALAVRAS.
AMANDA BUFA PARA MURILO MAIS UMA VEZ ANTES DE VOLTAR NA MESMA DIREÇÃO, COM UM CAMINHAR IRRITADO, ATÉ DESAPARECER.
A PORTA DO QUARTO BATE COM UM ESTRONDO.
MURILO SENTE UM LEVE TREMOR QUANDO ESCUTA A PORTA BATER E OLHA PARA A DIREÇÃO DO QUARTO, COM UMA EXPRESSÃO ESTÚPIDA NO ROSTO.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

CUMPLICIDADE

Amanda disse numa voz calma, ponderada:
— Fiz uma quiche de palmito.
Murilo tirou os olhos da janela, mas não virou-se completamente para a jovem.
— Estou sem fome.
Ela concordou, com grande compreensão, porque achou completamente possível Murilo não ter vontade de comer. Ela mesma sentia o estômago cheio, irritantemente estufado, embora sua última refeição tivesse sido um café com leite e torrada com ricota, quase cinco horas atrás.
— Aceita um copo d´água? – perguntou, com suavidade.
— Não, obrigado.
— Quer tirar o paletó?
— Desculpe – disse, tirando o paletó e o largando sobre o braço do sofá com cuidado.
Então se olharam, piscaram os olhos e, como se um sinal invisível tivesse soado, a sensação de cumplicidade voltou. Eles se aproximaram e se beijaram. Primeiro um leve beijo de reconhecimento, depois um longo e apaixonado. ©

NO RESTAURANTE JAPONÊS

Escolheu um restaurante japonês com boa fama na cidade, ele aguardava sua presença.
— Já estou me sentindo em casa. – Murilo disse, assim que a viu.
— Que ótimo – ela disse, envergonhada, porque aceitar o convite de um estranho para jantar é diferente de sentar-se ao lado desse estranho.
— Se você tiver o bom gosto para outras coisas como tem com restaurantes! – Murilo comentou.
Ela mordeu os lábios. “É claro que tenho, seu boboca, não está vendo meu acompanhante no jantar?”.
— Pensava que só existissem restaurantes de churrasco em Porto Alegre.
Ela abriu um sorriso compreensivo. “Nós chamamos de ‘churrascarias’, manezão, mas tudo bem, não sou eu quem vai se zangar por causa dessas diferenças culturais irrelevantes”. E respondeu:
— Imagina! Comemos de tudo nessa cidade.
— O mais sensacional é que vocês não engordam. Veja o exemplo da Gisele Bundchen. Seu corpo tem medidas perfeitas, mesmo sendo criada a carne de costela gorda.
“Meu Deus, vou precisar de muito saquê”
—Desculpe, a Gisele Bundchen não é portoalegrense.
— Não?
— Ela nasceu e cresceu numa cidade chamada Horizontina. Fica no interior do estado. Na região noroeste. Não sei o suficiente da sua vida particular pra poder te responder como era a alimentação dela, mas se a minha vida pode servir de parâmetro, eu te diria que “carne de costela gorda” não chega bem a ser uma tara alimentar entre as gurias gaúchas.
— Verdade?
Ela esgarçou os lábios e apertou os olhos na tentativa mais bem-intencionada do mundo de parecer compreensiva.
— É...
Ele sorriu constrangido, mas o que Amanda achou mais interessante foi que no sorriso não havia nenhum traço de vergonha. Ao mesmo tempo, ela não o classificaria como um sorriso de desdém ou superioridade. Era um sorriso constrangido completamente natural para o momento.
— Desculpe sobre esse equívoco.
— Não tem problema. Nem queira saber o que pensamos sobre os cariocas em geral – ela comentou, a título de reciprocidade.
Chamou o garçom e pediu logo o saquê.©

sábado, 4 de julho de 2009

ENCONTRO NO AEROPORTO

Murilo, empurrando um carrinho de metal com sua mala, entrou no saguão do aeroporto internacional Salgado Filho bastante ansioso. Procurou reconhecer o rosto de Amanda entre as mulheres presentes e ficou desapontado quando não a encontrou. Tinha conferido seu Blackberry, ela não enviara nenhuma mensagem, o que significava que o buscaria. Mas onde ela estava? Por um momento, ele ficou decepcionado. Então, refazendo-se da desilusão emocional, seguiu em frente, na direção da porta de saída automática.
Três ou quatro metros adiante, percebeu que alguém olhava fixamente para ele. Diminuiu o passo e girou a cabeça para o lado da figura misteriosa. Uma mulher jovem, com ares europeus, usando boina, óculos escuros e um longo sobretudo negro, o aguardava. Era uma mulher de postura elegante, como não pode deixar de notar. E sorriu para ele. Depois acenou. Não foi um aceno comedido. Ou uma saudação rápida e educada entre dois estranhos. Foi um negócio mais expansivo, cheio de carinho, agitado. “Será que é pra mim?”, ele pensou, antes de virar a cabeça para trás, esperando encontrar uma meia-dúzia de pessoas acenando de volta para a jovem (número suficiente para responder em pé de igualdade uma saudação tão extravagante). Mas não havia ninguém atrás de si, constatou, achando a situação um bocado estranha. Murilo seguiu adiante. Uma voz reclamou, irritada:
Tu não me reconheceu, seu grosso?
Ele olhou outra vez para a jovem misteriosa e dessa vez foi impossível deixar de ver Amanda.
— Você está linda! – ele disse, abrindo os braços de surpresa.
—Tu acha mesmo?
— Se eu acho? Eu tenho certeza!
Je m´appelle Amandá.
— Porque você ficou tão distante? O que aconteceu?
— Nada. Precisava te olhar de longe, ver teu rosto se aproximando do meu como se fosse um desconhecido, só pra dizer a mim mesma que tu veio pra me encontrar.
Ele fez uma carícia no seu rosto.
— Você me assustou, achei estranho ficar vagando sozinho pelo aeroporto.
— Estava tão bonitinho! Todo atrapalhado.
— Não me senti atrapalhado em momento algum.
— Ah, tava sim, fala a verdade.
— Já tinha decidido ir pra fila do táxi.
— Tu não iria me esperar? E se eu atrasasse? E se alguém batesse no meu carro?
— Você teria deixando uma mensagem.
— Às vezes não dá tempo!
— Não foi o caso, não é mesmo? Podemos esquecer o assunto?
Ela segurou o braço dele, ficando na posição para reiniciar a caminhada.
— Não tá mais aqui quem falou.
Murilo beijou Amanda. Um beijo rápido e intenso. Disse, quando saíram do aeroporto:
— O vôo não atrasou.
Amanda respondeu:
— Às vezes isso acontece.©

CANTADA

— Como é que tu descobriu meu telefone? – Amanda perguntou, num tom alarmado.
— Segredo profissional. – Murilo respondeu.
— Que absurdo – ela exclamou, querendo parecer ofendida. Mas a maneira como pronunciou sua reclamação, alongando levemente a palavra em um tom de surpresa, deixava entender que poderia estar saboreando o absurdo.
— Sua avó era carioca, mesmo? – ele perguntou, expondo logo um assunto que pudesse aproximá-los.
Ela ficou em silêncio. Ele esperou.
— Alô?
Ela suspirou.
— Nããoo. Foi só uma... maneira de te deixar... à vontade... – explicou, muito sem-jeito. Porque, aos trinta anos, jamais acreditou que passaria por situação semelhante.
Também esse foi o momento que pediu para ser fuzilada com um rímel por uma feminista ortodoxa. Ela não sabia onde enfiar a cara. Nem se conseguiria esconder o corpo inteiro dentro do seu sapato. “Deus, faça o prédio pegar fogo”, rezou, achando que só conseguiria sair debaixo da sua mesa sem ter as maças do rosto em brasa setenta e duas horas depois da ligação.
— Obrigado – ele informou, de maneira educada.
Ela sentiu tanta verdade naquele “obrigado” que foi impossível continuar afirmando a si mesma que o sujeito era só mais um filho da puta charmoso, conforme acreditara assim que atendera a chamada.
— Escuta, – disse, tomando as rédeas emocionais e tentando parecer calma e responsável — sei que foi um negócio bobo, mas...
— Eu achei muito terno. Estou em dívida com você. Posso convidá-la pra jantar?
Ela declinou o convite e fez de tudo para apressar o fim da ligação. Ele insistiu. Ela, ainda pouco à vontade, aceitou. Estava pagando por sua mentira. Deveria aceitar o castigo divino sem reclamar. Combinaram local e hora e ela desligou primeiro.
Amanda ficou por quase um minuto sem saber o que pensar. Deveria sorrir ou arrancar o fio do telefone? ©

BRIGUINHA FAMILIAR

— Que foi, meu bem? – a mãe perguntou com um tom amável, puro e completo, e sentou-se ao lado da criança.
— Bati a cabeça. Tá doendo.
— Bateu a cabeça? – quis saber, com um ar de espanto tão naturalmente criado para acalmá-lo que jamais poderia ser descrito como inverídico.
— Foi – ele completou — Aqui, ó. – disse, colocando a mão no ponto onde havia se chocado contra a cabeceira.
— Não foi nada, bebê – ela afirmou, puxando o filho para seu peito e o acalentando.
A filha olhava a cena com ar de desprezo. Não era um desprezo completo porque ela compreendia que o jogo de cena entre mãe e filhos deveria ser esse mesmo, e porque se lembrava bem de todas as vezes que precisou do carinho da mãe para suportar todos os enormemente triviais acidentes pelos quais já havia passado. Mas mesmo assim...
— Esse menino é um falso! Eu tava de olho aberto quando ele me jogou o copo d´água! Entrou água dentro do meu olho e agora eu acho que vou ficar toda roxa! Eu ainda tenho aula essa semana, você esqueceu, mãe?
A mãe ajeitou com cuidado o filho na cama, que se deitou com um suspiro de quem havia enchido o tanque de amor e carinho e começou a chupar o dedão.
— Deixa eu ver, querida. – disse, levantando-se. Segurou o rosto da filha com ambas as mãos e analisou com cuidado a região atingida.
— Tá vendo? Já tá roxo?
— Ficou um pouco vermelho.
— Eu disse!
O pai riu.
— Vermelho não é roxo. Tem uma grande diferença.
— Minha cara não tá mais normal e foi tudo culpa dele! – a filha reagiu, apontando acusadoramente o indicador na direção do irmão.
O pai achou que estava na hora de encerrar o assunto.
— Vamos esquecer tudo isso? Um, dois, três! Esqueceram?
Claaaro que não, pai!
— Pois é, que pena, pensei que ia dar certo... – disse o pai, afundando na poltrona e abrindo o jornal. ©