quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

APATOV E A COMÉDIA: MAIS O TEMPO PASSA, MELHOR FICA

A evolução temática de Judd Apatov

Muita gente acredita que a comédia, por natureza, não alcança as Questões Verdadeiras com a mesma energia que a tragédia. E pior, que o comediante, com o passar do tempo e o sucesso, perde o vigor.

Na verdade, todo verdadeiro comediante cresce dramaticamente com o passar do tempo. Aborda assuntos cada vez mais sérios e complexos, sem jamais perder a graça. Com Chaplin foi assim, com Woody Allen foi assim, entre outros. Atualmente, com Judd Apatow.

Por que com o Casseta & Planeta não aconteceu isso? Por que falta-lhes fôlego para 2 horas de um filme? Por que parece não existir assunto, trama, necessidade de narrar alguma coisa engraçada com os caras quando decidem pularem dentro do meio cinema?

O pior: quando o Pânico na TV produzir seu primeiro longa-metragem (Pânico no Cinema, hein? Criatividade...) E ISSO LOGO VAI ACONTECER, o que devemos esperar? Eu, em um mundo perfeito, como diria Clint, espero muito. A realidade é que será apenas engraçadinho ou muito louco. Não será um filme. A estrutura não vai ser pensada. Pra falar a verdade, tá caindo de madura essa verdade: o Pânico faturaria horrores com um longa (e se misturasse terror com humor, então!).

E quando o Marcelo Adnet e a nova turma do stand-up comedy se tornar veículo para filmes de humor? O Adnet tá pronto pra estrelar uma narrativa esperta, do feinho que é o máximo da galera. É, mas também há o perigo de se transformar em algo bonitinho, legalzinho e o pior, sem fôlego para 2 horas.

Pois bem, quando tudo acontecer (o terceiro filme dos Cassetas, o primeiro do Pânico e do Adnet) por favor, lembrem do Apatow.
Lembrem do Apatov (como um vaticínio algo teatral)

Tudo o que é nosso é comédia.

Senão, vejamos: Apatow se lança diretor em 2005 contando os últimos momentos de virgindade sexual de um homem (hetero) de 40 anos de idade. O filme acaba imediatamente após a primeira trepada. No exato clímax (não é mesmo?). A partir desse ponto de partida bizarro para hoje (observar que não havia nada de católico ou religioso no personagem, nenhum problema de saúde, nenhum ferimento de guerra hemingwayano – nenhum impedimento dramático clássico), Apatov criava a expectativa. Alguém sabe que Expectativa é um bom começo para se projetar em um filme? Será que... Alguma comédia brasileira pode existir usando bem a expectativa? Porque o que é O Virgem de Quarenta Anos senão a expectativa do público, assistindo a tantos “planos frustrados”, a tantas “roubadas”, de que o personagem de Steve Carell finalmente consiga dar a sua bimbada em paz? Qual era a graça? O momento certo jamais acontecia do jeito certo para o Carell. Ao espectador restava aguarda, se perguntando quando esse cara vai transar.

Dois anos depois, Apatov surge com uma temática bem mais madura. Viram só? Bem mais madura. Não mais idiota ou menos enérgica ou menos inteligente ou menos engraçada. Mais madura. Depurada. Na verdade, surge com uma baita idéia, que traz uma das melhores complicações já imaginadas para atrapalhar o casal protagonista dentro das convenções da Comédia Romântica. A complicação? Nada mais nada menos do que uma gravidez. Ora, o que é a comédia romântica senão o desejo de um garoto comer uma garota ou vice-versa? Ora e qual é o resultado bem provável senão uma gravidez? O resultado mais óbvio se transforma na complicação mais interessante. Obviamente. Apatov pensa antes de rir. Ou vice-versa.
Se aceitarmos, como eu aceito que “Desde que o cinema é cinema que a comédia romântica segue as mesmas regras: homem conhece mulher, homem e mulher se estranham no começo, homem e mulher vão se acertando, homem e mulher se amam no final”, conforme escreveu na Cinética o crítico e cineasta Eduardo Valente, então com Ligeiramente Grávidos Apatov utiliza a estrutura clássica da Comédia Romântica e a recheia com situações e motivações modernas, escondendo por trás desta fachada os velhos alicerces do gênero. Um salto e tanto na humanidade dos personagens. Garoto se transforma em Homem por causa da Mocinha mas bate muita cabeça antes. Genial. Tem pegada, não é gratuito (também não é pomposo) mas você está entendendo: não é debilóide nem acadêmico. É humano. O que separa o casal é justamente a gravidez da mocinha. Claro que o que une o casal no final é a mesma gravidez (e posterior nascimento da criança).

Então, em 2009, o parafuso aperta um pouco mais. Apatov agora fala explicitamente do que é menos engraçado: a morte. Mas fala com humor, inteligência, ternura, humanidade. O verdadeiro tema do comediante é a morte. Tem algo mais difícil de se trabalhar? É vender geladeira pra esquimó. Quem vai querer? Quando um comediante fala sobre morte, solidão, fracasso, erros, então ele se torna O Comediante. Pode falar sobre qualquer assunto agora, que sempre será verdadeiro. PhD de comediante. Funny People é o PhD de Apatov. Tem seus defeitos, claro, afinal, ninguém encara um PhD sem umas resvaladas, tanto que está sendo lançado direto em DVD no Brasil.

Mas é sempre um alento quando um comediante resolve fazer graça com o que não tem graça.

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